sábado, agosto 28, 2010

VAMPIROS

No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vem em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas

São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

Não sei porquê mas lembrei-me do Zeca Afonso

quarta-feira, agosto 25, 2010

BICO DE UM PREGO



[Diabo na Cruz - "Bico de um Prego"]

Segui-te na estrada
Cantei-te para nada
Fiz montes e vales em busca de ti
Encontrei-me às portas da Morte
De tanto vergar, de tanto insistir
E, no mar, mil virgens à espera gritaram meu nome
Eu não respondi!


Sonhei que era cego
No bico de um prego
E quando acordei fui chorar escondido
Quem for Rei, virá num cruzeiro
Se eu quis ser rei foi para sê-lo contigo
Quando o Sol girar, e o Céu afundar
Ouvirás, finalmente, o que eu digo


Dei o teu retrato ao genro de um sapo
Herdei comprimidos para adormecer
Ah, e rezei à Santa Fortuna
À Deusa das Tréguas do meu querer
E a Verdade roubou um bote
De casco partido para ir morrer


A Jurisprudência
Leu-me a sentença:
Eu fora detido por parecer diferente
E morar na casca de um ovo
Sem ter cabido na cova de um dente
Quando eu quis falar ela pôs-se a andar
Tal o medo de ficar doente


Até que a Mãe-Feia
Me deu a ideia
De partir para a Guerra Santa do Sul
Ah, e talvez aí avistasse
Nalguma burka o teu olho azul
Só que o Vento ouviu no deserto
Que alguém andava perto e não eras tu


Perdido e cansado quis voltar a nado
Mas já ia longe a minha juventude
Fui deitar-me ao pé de um barraco
Adormeci num balde de crude
Quando o Sol nasceu Deus mostrou-se e eu
Defendi-me o melhor que pude